A instalação de sirenes fixas na Zona de Autossalvamento (ZAS) da Usina Hidrelétrica Colíder (UHE Colíder), anunciada pela Eletrobras em 17 de outubro de 2025, não representa um avanço espontâneo em segurança de barragens, mas sim uma resposta tardia à ação de tutela de urgência cautelar antecedente ajuizada pelo Ministério Público de Mato Grosso (MPMT) contra as Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobras), a Copel Geração e Transmissão e o Estado de Mato Grosso.
O alerta é feito pelo procurador de Justiça Gerson Barbosa, coordenador do Centro de Apoio à Execução Ambiental (CAEX Ambiental), que classificou a medida como resultado direto da atuação institucional do MPMT diante da omissão prolongada da concessionária. “É lamentável que a consciência do dever só venha após a provocação judicial. A segurança da população não pode depender de ações judiciais para que obrigações legais sejam cumpridas”, afirmou.
A iniciativa da empresa ocorre em um contexto de risco elevado. Desde agosto de 2025, a barragem da UHE Colíder opera em nível de segurança “Alerta”, após sucessivos danos em drenos essenciais para o escoamento da pressão hidráulica. O Plano de Ação de Emergência (PAE), revisado em julho de 2024, previa apenas sirenes móveis acopladas a veículos, uma solução precária e incompatível com a urgência exigida em situações de emergência.
Segundo o Ministério Público, a instalação das sirenes fixas não reforça o compromisso da empresa com a segurança, como divulgado pela Eletrobras, mas sim evidencia que somente após pressão institucional a concessionária passou a cumprir obrigações legais e técnicas já previstas há anos. “Infelizmente, foi preciso uma ação cautelar para que medidas mínimas fossem adotadas. E mesmo assim, a população continua em estado de alerta, sem informações claras sobre o que causou os danos à estrutura da barragem e quando o problema será definitivamente solucionado”, destaca o procurador de Justiça.
Para o MPMT o mais grave é que mesmo após a elevação do risco da barragem, não houve revisão tempestiva do PAE nem implantação das medidas corretivas exigidas pela Lei nº 12.334/2010, alterada pela Lei nº 14.066/2020, e pela Resolução Normativa ANEEL nº 1.064/2023. “A legislação é clara: o empreendedor deve garantir sistemas de alerta permanentes e funcionais na ZAS, em articulação com a Defesa Civil. Não se trata de faculdade, mas de dever jurídico”.
A Ação Cautelar, protocolada em setembro de 2025, aponta uma série de inconformidades na estrutura da barragem, como ausência de instrumentação piezométrica em 14 drenos, falta de peneiras para análise de turbidez em 55 drenos, e registros de carreamento de materiais em 18 deles, indícios de erosão interna, fenômeno conhecido como piping, que pode evoluir silenciosamente até a ruptura da estrutura.
Além dos riscos à vida humana, o MPMT também destaca os impactos ambientais e socioeconômicos causados pelo deplecionamento do reservatório, medida adotada para reduzir a pressão sobre a estrutura da barragem. A redução abrupta do nível da água provocou mortandade de peixes, prejuízos à pesca e ao turismo, e afetou diretamente comunidades ribeirinhas e indígenas, como o povo Munduruku, que vive a jusante da usina.
“Em matéria de segurança de barragens, não há espaço para improvisos. A gestão de risco exige rigor técnico, transparência e tempestividade. A instalação tardia das sirenes fixas, sob o manto de anúncio institucional, não apaga a omissão pretérita nem substitui a necessidade de revisão integral do PAE, com inclusão de protocolos robustos, testes periódicos e integração efetiva com os Planos de Contingência Municipais”, finalizou o procurador de Justiça.